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O Mito do Vampiro no Século XIX (Realizada em: 25/06/20)

Em inúmeras culturas ao redor do mundo, desde a Antiguidade, existem lendas e histórias que fazem referência a criaturas míticas bebedoras de sangue, de sémen, excreções vaginais, ou comedoras de carne de humanos.

O conceito de vampirismo existe portanto há milénios, mas a ideia do Vampiro tal como o conhecemos hoje, tem origem na Europa de Leste e Balcãs, entre os séculos 17 e 18. Depois difundida, explorada e transformada no vampiro sofisticado e carismático, na Alemanha e Inglaterra do século 19, através da literatura.


Apesar de algumas variantes locais, como por exemplo, os Strigoi romenos, ou as Vrykolakas gregas, os vampiros são seres míticos, mortos vivos, que se alimentam do sangue das suas vítimas.

Estas tradições orais, superstições e lendas de seres demoníacos, povoavam o imaginário dos povos da Europa de Leste. E a partir do século 17 começaram a ser registados e anotados, depois de uma série de acontecimentos que provocaram uma histeria colectiva que teve de ser travada pela força da lei.

As crenças pré-cristãs das culturas dos Balcãs e da Europa Oriental, davam ênfase especial à separação da alma e do corpo. Entre os eslavos acreditava-se que depois da morte, a alma saia do corpo e vagueava por 40 dias até à sua passagem definitiva para a vida eterna.

Durante esse período, essa alma podia reentrar no corpo do morto e ser benevolente ou causar perturbações na comunidade ou na sua família. Especialmente se a morte tivesse sido violenta, de alguém não batizado, de um grande pecador ou de um praticante de magia.

Por isso os ritos fúnebres tinham de ser executados com precisão, ou a alma podia tornar-se impura, e o corpo susceptível à possessão por espíritos impuros ou outras almas impuras

.

Os demónios e os espíritos interferiam na vida dos vivos, podiam ser bons ou terríveis. Algumas dessas entidades eram manifestações de antepassados, ou outros humanos falecidos, e podiam aparecer na sua forma humana ou em formas animais. Se fossem destruidores, podiam arruinar colheitas, sugar sangue ao gado ou mesmo de humanos.

O Vampiro era este espírito impuro, vingativo, um espírito ou alma que tomou possessão de um corpo em decomposição. Ciumento dos vivos, que necessitava sugar o seu sangue para manter a sua existência corporal de não-vivo.


Um dos primeiros registos de atividades vampíricas que atravessou fronteiras deu-se na Croácia, nos finais do século 17. Um camponês falecido alguns anos antes, era acusado de atormentar os aldeões bebendo-lhes o sangue, e de assediar sexualmente a viúva. Uma estaca foi enterrada no seu coração, e temendo que não fosse suficiente, decapitaram o corpo.

Durante o século seguinte, uma série de acontecimentos de natureza vampírica aconteceram um pouco por toda a Europa Oriental.

A abertura de sepulturas suspeitas, para identificar os mortos vivos, seguidas de colocação de estacas, incineração ou decapitação dos corpos, tornaram-se frequentes. O exército era chamado e funcionários públicos registavam todos os acontecimentos. A histeria propagou-se a quase toda a Europa.

Um dos casos mais famosos passou-se na Sérvia em 1727, então sob o domínio do Sacro Império Romano-Germânico, e do Imperador Carlos VI da Casa Habsburgo. Um camponês, antigo soldado, após um acidente fatal que ocasionou a sua morte, fora visto por populares.

Poucos dias antes de morrer, tinha contado à sua noiva que tinha sido atacado por um vampiro durante o serviço militar.

Contou que tinha conseguido matar esse vampiro, depois de ser mordido, e que comera da terra do seu túmulo. Os populares que alegaram tê-lo visto, morreram passados dez dias e o exército foi chamado.

A sepultura foi aberta, e o corpo que já tinha quarenta dias de enterrado, parecia estranhamente fresco. Perfuraram-no com uma estaca, e o sangue jorrou, foi depois decapitado e queimado.

Fizeram o mesmo com todos os outros que alegadamente tinham sido vítimas dele. Mas três anos depois, mais dezessete pessoas tinham morrido com alegações de terem sido vampirizadas. O Imperador Calos VI ordenou um inquérito e um médico foi enviado.


Novos casos foram reportados, e as acusações de vampirismo, a abertura de campas e consequentes estacamentos, decapitações, e queima de corpos, tornou-se imparável.

Qualquer túmulo que apresentasse buracos na terra era considerado suspeito. Rapazes virgens eram colocados sobre cavalos, brancos ou pretos, e levados a passear sobre os cemitérios ou chão de igrejas, pois onde eles parassem, estava um vampiro.

Espelhos eram colocados nas portas das casas, sementes de mostarda nos telhados, água benta, rosários e crucifixos espalhados pelas casas. A morte do gado era considerada sinal seguro de atividade vampírica.

Entes queridos cuja morte era de algum modo suspeita eram sepultados de cabeça para baixo, de forma a impedir que se tornassem um morto vivo.

As variantes locais eram muitas, tais como: cacos de barro com inscrições sagradas ou pedras na boca do morto, alho na boca, cruzes de cera, foices junto do corpo, limões na boca, agulhas de metal no coração, pedaços de ferro na boca, nos olhos, nas orelhas e dedos do morto, extrair e queimar o coração…


Dois tratados foram escritos por personalidades da Igreja. O primeiro, em 1744, do arcebispo italiano Giuseppe Davanzati, que após seis anos de investigações exaustivas, concluiu que tudo não passava de superstições de gente inculta.

O segundo, de um teólogo francês e padre beneditino, Dom Augustin Calmet, em 1746, com conclusões muito ambíguas, onde praticamente atestava a existência de vampiros.

Tudo terminou com a filha de Carlos VI, a Imperatriz Maria Teresa de Áustria. Tendo enviado o seu médico particular para investigar as alegadas atividades vampíricas, e tendo este concluído da sua falsidade, sem hesitar promulgou leis proibindo a abertura de campas e a profanação de cadáveres, pondo fim à epidemia.

Mas o mito já tinha ultrapassado fronteiras, e ganhado a imortalidade na literatura, na gravura, na pintura, nas histórias contadas de boca em boca.


O Romantismo e a Inglaterra do século XIX

Os primeiros poemas conhecidos, sobre vampiros, são alemães. “Lenora” (1773), de Gottfried Bürger, e “A Noiva de Corinto” (1797), de Goethe.

Estes poemas influenciaram os poetas britânicos Coleridge, a escrever “Christabel” (1801) e Keats no poema “Lamia” (1819). Lord Byron e Shelley, dois dos mais importantes nomes do movimento romântico, também partilharam do mesmo entusiasmo, e Byron escreveu “O Giaour” em 1813.

O Romantismo foi um movimento estético, e também filosófico, que buscava interpretar os acontecimentos e problemas da sua época através da arte, mas de forma a serem entendidos por todos. Com uma visão do mundo centrada no indivíduo, na emoção e na subjetividade. Nasceu em finais de século 18, e ocupou quase todo o século 19.

O drama, os amores trágicos, as utopias e lendas nacionais, a força criativa dos homens e a imaginação popular, o sonho e a fantasia, a emoção dos momentos fugazes, o misticismo, a magia da natureza. Tudo isto constituía a base e a inspiração dos românticos. A temática do Vampiro era como ouro sobre azul, no espírito dos Românticos.


Em 1816, Lord Byron parte numa viagem pelo continente europeu acompanhado do seu médico, John Polidori. Em Maio desse mesmo ano, alugam a Villa Diodati, próxima ao lago da cidade de Genebra. A eles juntam-se o poeta Percy Shelley, Mary Godwin, sua futura mulher, e a meia irmã desta, Claire Clairmont.

Numa tarde de tempestade, que os impedia de saírem, Byron lança o desafio de todos eles criarem uma história de fantasmas e de horror, que seria contada alguns dias depois. O conto que ganhou, foi o de Mary, mais tarde transformado naquela que viria a ser a sua obra mais famosa, “Frankenstein ou O Moderno Prometeu”.

Byron tinha feito a sua história, mas só a esboçando, e não lhe dando continuidade. No entanto, Polidori anotara a história, e em 1819, depois de retornar a Inglaterra, publica o conto “O Vampiro” a história de Lord Ruthven, naquela que é a primeira representação do vampiro como aristocrata degenerado.

O conto teve sucesso imediato, com direito a representações teatrais. Lord Ruthven foi o primeiro vampiro literário, e encarnava também, o preconceito existente entre a aristocracia e as classes trabalhadores.


James Malcolm Rymer, em 1840, inicia a publicação de “Varney, O Vampiro ou O Festim de Sangue” uma confusa história de vampiros, que tem a sua conclusão em 1847 com um volume único com 220 capítulos.

E em 1872, Sheridan Le Fanu, publica “Carmilla”, a história de Laura e da vampira Carmilla, renovando todo o imaginário vampírico e causando uma profunda impressão em Bram Stoker.


Drácula.

Bram Stoker idealizou e escreveu o seu Drácula, numa Grã Bretanha repleta de paradoxos. Ao mesmo tempo que era um dos impérios que dominava o mundo, mãe da Revolução Industrial, com avanços extraordinários em todas as áreas do saber, terra de oportunidade para imigrantes de todos os cantos do mundo, enfrentava também inúmeros problemas sociais

Londres era uma cidade superlotada, com péssimas condições de salubridade públicas. As zonas pobres da cidade, da classe trabalhadora, estavam repleta de crime, prostituição, fome e epidemias. Mas ao mesmo tempo, pessoas mais esclarecidas lutavam pelos seus direitos sociais, e a ciência procurava soluções para as epidemias e doenças, que pareciam sem solução.


Depois de ler “Carmilla”, Bram Stoker ficou extremamente interessado no mito do vampiro. Tornou-se um frequentador assíduo do Museu Britânico, pesquisando mapas e toda a informação possível sobre a região onde surgiram os mitos dos vampiros, a Europa Central e Oriental.

No museu encontrou um folheto datado de 1485 da cidade de Lübeck, na Alemanha, que descrevia as atrocidades causadas por um príncipe romeno chamado Vlad Tepes, Príncipe da Valáquia (1431-1476), também conhecido como Drácula, título que recebera do seu pai.

Este ganhara o título por ter servido a Ordem do Dragão, uma fraternidade secreta, militar e religiosa, criada em 1387 no Sacro Império Romano-Germânico, cujo fim era proteger a Igreja Católica.


Ao fim de sete anos de pesquisa, Bram Stoker tinha o seu conde Drácula. Baseado numa personagem histórica, Vlad III o Empalador. E através do seu caçador de vampiros, Abraham Van Helsing, o herói redentor de todo o mal, constrói o seu mito de vampiro.

No seu livro, todos os arquétipos da mitologia de vampiro são citados.

A imortalidade, a força, o crucifixo, a hóstia, o espelho, o solo nativo, o espinheiro, o domínio sobre os animais, a capacidade de se transformar em morcego ou cão, além de poder diminuir de tamanho ou mesmo de fazer surgir uma bruma à sua volta ou se transformar em uma poeira natural à luz do luar, mas menciona também a limitação de seus poderes, que quase cessam com a chegada do dia.

A morte de Drácula é um fim dado a todos os males que devastavam a Inglaterra do século 19, desde as suas doenças pestilentas, até à invasão desregrada de imigrantes que vinham de regiões dominadas pelos impérios europeus.


“Drácula” foi também a expressão da superioridade da mentalidade ocidental, face à oriental, supersticiosa e atrasada, em costumes e tecnologia.

Publicado pela primeira vez em 1897, Drácula, tornou-se um marco nos romances góticos. Ele mostrava o vampiro como um ser poderoso, sem remorsos, capaz de qualquer coisa para conseguir o que desejava. A partir daí, ele entrou para sempre no imaginário coletivo.

Em filmes, literatura, banda desenhada, expressões artísticas de todos os tipos, jogos, subculturas, moda, a mítica do vampiro está por todo lado. E aqui, entre nós, felizes e orgulhosos jogadores do IMVU.


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